Quando foi criada a então Fundação Curro Velho (atualmente Núcleo de Oficinas Curro Velho), em 1990, a entidade tinha dois núcleos: o prédio do bairro do telégrafo, onde funciona o Curro Velho; e o prédio do bairro de Nazaré, onde está a Casa da Linguagem. Na segunda matéria sobre os 35 anos do Curro Velho, vamos conhecer um pouco da história dessa Casa que é a nave mãe da palavra estudada enquanto som, signo, língua e linguagem. Integrante da Fundação Cultural do Pará (FCP) desde 2015, este espaço se consolidou como um ponto de referência para a literatura e as diversas formas de expressão em Belém.
A fachada vistosa da Casa chama atenção dos passantes
Tombado em 1985, o Casarão que fica na Avenida Nazaré, número 31, foi residência da família de Francisco Bolonha, engenheiro muito atuante no processo de modernização e embelezamento da Belém de Antônio Lemos. Bolonha, que atuou entre 1895 e 1938, introduziu o estilo eclético em palacetes e disseminou materiais modernos como ferro, vidro e cimento armado. O prédio possui mais de 1.800 m² e tem características marcantes como grades de ferro, janelas francesas e piso em ladrilho hidráulico. A partir do governo de Lauro Sodré - encerrado em 1921 - até 1970, o imóvel abrigou o Grupo Escolar Floriano Peixoto, surgido em meio ao projeto liberal de modernização pedagógica.
Antigo Grupo Escolar Floriano Peixoto em estado de abandono, fim da década de 80
Prédio da Casa da Linguagem em obras, 1990
Após anos cumprindo outras funções, o prédio foi restaurado e, em 1991, foi inaugurado como a Casa da Linguagem, dando início à sua missão de ser um farol da expressão verbal e artística. Concebida para ser um centro dedicado ao estudo da palavra em suas múltiplas formas, a Casa teve como primeiro diretor o poeta Max Martins, uma das vozes mais significativas da poesia contemporânea do Pará, e contou com a consultoria da escritora Maria Lúcia Medeiros. Juntos, eles estabeleceram as bases intelectuais e artísticas do projeto.
Foto histórica: Max Martins (primeiro diretor da Casa), Dina Oliveira (Superintendente da Fundação Curro Velho, ao meio) e Maria Lucia Medeiros (consultora da Casa)
Desde sua criação, a Casa se dedicou à leitura e à linguagem, operando como um polo de formação e diálogo. Longe do formato escolar tradicional, a instituição oferece oficinas que abrangem áreas como produção de texto, poesia, língua brasileira de sinais (Libras) e redação para o Enem, além de ter integrado à sua oferta de oficinas outra linguagens artísticas, como teatro e expressão (cênicas), violão (musical), estamparia e desenho (visuais), artes fotográficas, audiovisuais e digitais.
A importância social e formativa da Casa é destacada por Celeste Iglesias, diretora do Núcleo de Oficinas Curro Velho: “A palavra, em todas as suas manifestações – das libras à poesia, do texto de Enem à cena teatral – é a matéria-prima e a ferramenta de transformação da Casa da Linguagem. O que fazemos aqui é empoderar pessoas, oferecendo as ferramentas necessárias para se expressar e intervir no mundo. Ocupar este prédio histórico, que já foi residência e escola, reforça a ideia de que o conhecimento é o bem maior, e a FCP tem o papel de zelar por essa transmissão.”
A bela Casa da Linguagem completa 35 anos
Elaine Oliveira, técnica cultural da FCP explica que o espaço da Casa da Linguagem tem sido um centro de referência no letramento literário, na expressão da escrita criativa e na construção dos livros autorais. “É uma referência também para alunos que querem ter domínio do texto mais referencial para concurso, para o Enem, então é um espaço de referência do ensino e da escrita por meio da linguagem verbal. Por isso, esse espaço precisa ser preservado e ter investimento, porque o letramento literário e por meio da linguagem verbal é fundamental para a construção de conceitos e de interpretação da realidade”, detalhou.
Um respiro de beleza e tranquilidade no coração da capital
O servidor Francisco Souza, conhecido por todos que trabalham e estudam na Casa, testemunhou o estado de abandono em que o prédio estava no final da década de 80, e vivenciou a restauração e fundação da Casa da Linguagem. Vindo do Curro Velho a mando da então Superintendente Dina Oliveira, ele descreveu o imóvel antes da reforma como um espaço "parado, abandonado" e repleto de pó. Puxando pela memória, seu Francisco fala da importância do centro cultural para a cidade nos seus primeiros anos de funcionamento, logo após a inauguração em março de 1991: "A procura aqui era muita, dava muita gente. Eram filas e filas para fazer inscrição. Na época era tudo na caneta, não tinha computador. E os servidores se revezavam no atendimento e na orientação dos alunos”, revela.
O local ainda abriga a Biblioteca Francisco Paulo Mendes e o Cineclube Pedro Veriano - que está num processo final de reforma e deve ser inaugurado em breve -, promovendo constantemente eventos que celebram autores paraenses e valorizam a produção local.
Cheia de luz, a Biblioteca tem grandes janelas voltadas para a Av. Nazaré e também para a Av. Assis de Vasconcelos, um privilégio
A Casa da Linguagem também conta com a pequena porém robusta Biblioteca Francisco Paulo Mendes
A Casa não é apenas um centro de ensino; é um monumento à cultura e um celeiro de criatividade que pulsa no coração histórico de Belém. Ao celebrar 35 anos, o espaço reafirma seu papel como símbolo da resistência cultural e um elo vital entre o passado e o futuro paraense. Graças ao trabalho das servidoras e servidores, que mantêm suas portas abertas e suas oficinas gratuitas, a Casa da Linguagem assegura que a história e a arte continuem sendo escritas – e reescritas – pelas novas gerações de Belém. Parabéns e vida longa à Casa da Linguagem!